Alienação parental inversa: a manipulação da pessoa idosa

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A população brasileira está em um processo acelerado de envelhecimento. Dados do Censo 2022 realizado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) mostram que o total de pessoas com 65 anos ou mais no País corresponde a 10,9% da população, o que equivale a mais de 22 milhões de pessoas. O que chama a atenção é que o número é 57,4% maior do que o registrado na pesquisa anterior, de 2010.

O aumento da população idosa, no entanto, não está sendo acompanhado pela adaptação da sociedade para inserir e cuidar desse grupo. Segundo um levantamento da Ouvidoria Nacional de Direitos Humanos, no primeiro semestre de 2023, foi registrado um aumento de 38% nos casos de violência contra pessoas idosas, em comparação com o mesmo período do ano anterior. Ao todo, foram 65 mil denúncias e todos os Estados apresentaram elevação no índice, com destaque para Tocantins, Amapá, Pernambuco e São Paulo.

 

Segundo o Estatuto da Pessoa Idosa, “considera-se violência qualquer ação ou omissão praticada em local público ou privado que lhe cause morte, dano ou sofrimento físico ou psicológico”. Os tipos de violações mais comuns são a física e a psicológica, mas a violência contra a pessoa idosa pode assumir várias formas: “existe a violência patrimonial, que acontece quando um indivíduo gera prejuízo financeiro a outro; a discriminação, que é quando o idoso é visto como incapaz, uma pessoa que não tem conhecimento; e a violência sexual, que é menos falada, mas que também ocorre”, elenca a advogada especialista em direito previdenciário Natércia Maria Magalhães.

Outra situação que não está prevista no estatuto, mas tem sido cada vez mais comum é a alienação parental. Na teoria, o termo é usado para descrever a manipulação emocional de crianças em casos de divórcio, quando um dos genitores age para colocar os filhos contra o outro. Considerando que o idoso também está inserido em um contexto de fragilidade e muitas vezes é dependente da família, tem sido comum observar o empenho de um responsável para causar o seu afastamento do restante dos familiares, caracterizando um comportamento que é descrito como alienação parental inversa.

“Aquele filho ou responsável pela pessoa idosa cria situações em que ela passa a enxergar outros membros da família como pessoas que não podem estar junto a ela. Esse ato tem como principal objetivo o afastamento da convivência dos demais familiares com o idoso, muitas vezes por motivos financeiros”, explica Natércia. Essa violação pode ser acompanhada por outras: “há casos em que o idoso é convencido de que é um estorvo para os outros e acaba optando pelo afastamento para não causar danos”. Muitas vezes silenciosa e invisível, essa condição é um desafio que merece atenção e uma ação urgente.

 

Impactos do afastamento
Uma das grandes características da alienação parental inversa – quando cometida pelos filhos – é a manipulação sutil dos pensamentos do idoso, que acaba se convencendo de que aquilo que está sendo dito é verdade, por mais absurdo que seja.

“Há uma certa dificuldade da pessoa idosa identificar esse tipo de violação, pois, com o passar do tempo, ela acredita em afirmações que dizem que ela não presta para mais nada ou que é um peso para família e o isolamento colabora para que isso aconteça”, cita Natércia.

Assim, de forma gradativa, a comunicação entre os familiares é reduzida ou até proibida, o que deixa o idoso em uma espiral de solidão. Esse isolamento não afeta só as relações familiares, como diz a advogada: “isso pode intensificar problemas de relacionamento e impulsionar o surgimento de doenças físicas, em razão da falta de vontade de se alimentar ou de fazer atividades físicas”.

A solidão, aliada à sensação de abandono, pode levar ainda a problemas como depressão e ansiedade. Além disso, a falta de interação social e de suporte emocional contribui para o declínio cognitivo. “O ser humano, em sua essência, precisa viver de forma sociável. O isolamento faz mal em qualquer idade, ainda mais nos idosos por conta do sentimento de rejeição por parte de pessoas que outrora eram próximas. Isso acarreta severos problemas psicológicos e físicos. Uma mente com transtornos tende a transferir o problema para todo o corpo”, diz o Bispo Valter Pereira, responsável pelo Calebe, projeto social mantido pela Universal voltado a atender pessoas idosas.

 

Rompa o silêncio
A advogada explica como lidar com essa realidade: “quando o idoso consegue identificar que está sofrendo alienação parental inversa, ele pode procurar inicialmente alguém da família em quem mais confie ou pode buscar as autoridades, por meio do Disque Direitos Humanos (Disque 100), por exemplo, que é o canal para denunciar a situação”.

Já os familiares que estão sendo impedidos de conviver com o idoso, além de denunciar, podem buscar os serviços de assistência social ou acionar a Justiça por meio de uma ação declaratória indicando a alienação parental com objetivo de limitar a ação do alienante. “As pessoas ao redor devem estar atentas a mudanças de comportamento do idoso, emagrecimento repentino e preferência por isolamento. Muitas vezes, em razão de sua condição de fragilidade, ele tem medo de denunciar um familiar e prejudicá-lo ou não percebe o que está acontecendo”, avalia Natércia.

É importante ressaltar que a alienação parental inversa é um problema de toda a sociedade, já que a Constituição Federal garante a proteção da família, com especial atenção aos idosos. Um projeto de lei de 2017 propõe incluir a alienação parental inversa como um tipo de violência no Estatuto da Pessoa Idosa, mas segue parado na Câmara dos Deputados.

O fato é que só com esforços coordenados da sociedade, das autoridades e das famílias será possível construir um caminho em direção a um País mais justo e inclusivo para todas as gerações.

fonte https://www.universal.org/noticias/post/alienacao-parental-inversa-a-manipulacao-da-pessoa-idosa/

 


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