Conhecer Peto* não foi fácil. A vila dele está em uma das áreas mais isoladas no Sul do Laos. Da cidade mais próxima de onde a equipe da Portas Abertas saiu, levou quase quatro horas atravessando estradas lamacentas, florestas densas e desfiladeiros profundos com rios sinuosos abaixo. Mas essa é a única forma de chegar a Peto. “Algumas vezes, as condições da estrada são piores que isso, principalmente durante a estação chuvosa. As estradas são quase intransitáveis e perigosas – lama grossa, deslizamentos de terra e enchentes. Esses são alguns obstáculos que alguém pode encontrar ao viajar para cá”, diz Nui*, nosso guia local e amigo de Peto.
Apesar de terem permissão para ir à vila de Peto, o encontro com ele foi discreto. A casa dele era apenas a alguns metros da casa onde a equipe se hospedou, mas seria muito arriscado permanecer por muito tempo, pois os vizinhos dele são do exército. Peto poderia ser monitorado ou interrogado se ficassem muito na casa dele. A vila é muito distante para ser visitada por turistas e muito perigosa para excursões. Uma visita de estrangeiros gera curiosidade nos moradores.
Eles decidiram se encontrar com ele na casa onde estavam. E para a surpresa da equipe, um grupo de homens do exército estava na mesma hospedagem. “O chefe da força militar no distrito está aqui para inspeções, sua tropa está ficando aqui. Vamos todos ser cuidadosos. Eu vou ficar no saguão e procurar por nosso grupo. Eu ligo para você se precisarmos fazer as malas”, disse um dos membros da equipe. Felizmente, não precisaram partir sem ouvir a história de Peto.
Sem casa por causa de sua fé
Peto, um homem em seus 40 anos, limpou a garganta enquanto observava a sala cheia de outros cristãos que esperavam para ouvir sua história. Os olhos dele mostravam que estava nervoso e radiante. “Esta é a primeira vez que ele é visitado por cristãos de outras partes do mundo ou mesmo de outras partes do Laos”, disse Nui.
Peto é casado, pai de dois filhos, agricultor e evangelista. Muito antes de se tornar cristão, ele e sua família cultuavam espíritos e praticavam adoração ancestral. Durante a maior parte da vida, ele não tinha ideia do que ou quem era Deus. Até 2010, quando ficou muito doente. Por três dias, não comeu e não trabalhou por causa de uma dor de dente. “Minha doença me levou a conhecer a Jesus. Um pastor orou por mim e fui curado. Por causa disso, me tornei cristão.” E não demorou muito para a esposa também aceitar a Jesus.
Mas apenas algumas semanas depois, os problemas começaram. “Quando o chefe da vila e os moradores descobriram que tínhamos nos tornado cristãos, ficaram infelizes sobre isso e queriam nos expulsar da vila. Eles nos alertaram por três vezes para pararmos de crer em Jesus, caso contrário seríamos expulsos. No terceiro aviso, nos disseram que não se responsabilizariam se algo acontecesse conosco. Foi mais do que só um aviso, foi uma ameaça”, contou Peto.
Mas ele estava inabalável. Além de continuarem na vila, ele ficou mais curioso sobre o Deus que o curou. Então começou a se aprofundar no relacionamento com o Senhor e compartilhar sua palavra com parentes e moradores da vila. A ousadia e paixão de Peto lhes pareceu um pouco estranha. Isso desencadeou uma série de incidentes de perseguição para ele e sua família.
“Eu não recebia mais ajuda de projetos oferecidos por caridades ou organizações privadas. Em outro incidente, moradores da vila mataram todos os meus animais de criação. Eles atingiram brutalmente meus patos, galinhas e cabras com varas até que morressem”, explica.
Mas isso não o intimidou. Quando a esposa de Peto adoeceu e ele se recusou a fazer oferendas aos espíritos da vila, ele e sua família foram forçados a deixar a vila. “Eles me forçaram a oferecer uma vaca, um búfalo e muito mais para o espírito da vila. O que mais eu poderia dar? Eles já tinham matado todos. E por que eu faria isso novamente? Eu agora pertencia a Jesus. Ao invés disso, pedi ao nosso pastor para orar por minha família e minha esposa. Ela foi curada, ficando melhor a cada dia, mesmo não tendo ido ao médico ou oferecido algo aos espíritos. Eu me ative à promessa de Deus na Bíblia de que se as orações são feitas com fé, ele curará o doente. Eu orava a Deus com fé todos os dias. Quando não os obedeci e não fiz a oferenda, eles ficaram com raiva, se recusaram a me aceitar e nos expulsaram à força da vila.”
Quando Peto e sua família deixaram a vila, só puderam levar o que conseguissem carregar. Deixaram o lugar com um cobertor, algumas roupas e equipamentos. Eles andaram por dois dias até chegarem na vila onde estão atualmente. “Quando deixei a vila, não questionei nem duvidei de Deus. Três outras famílias cristãs também foram expulsas. Havia apenas seis famílias cristãs, incluindo nós. Apenas duas famílias tiveram permissão para permanecer.”
“Eles me querem morto”
As adversidades de Peto não acabaram quando se mudou para outra vila. Em 2013, com a ajuda de um parente de sua esposa que trabalhava em um campo militar distrital, Peto se tornou soldado. “Eu disse sim quando ele me perguntou se eu queria me unir às forças armadas do governo. Eu precisava de um emprego. Ele escreveu uma carta de candidatura para mim e eu entrei no exército”, conta.
Embora soubesse quais seriam as consequências, Peto compartilhou com quatro ou cinco amigos no exército que era cristão. Ele também compartilhou o evangelho. “No momento em que ouviram sobre isso me queriam morto. Disseram que atirariam em mim se não desistisse da minha fé. Eles eram meus amigos, mas ameaçaram me matar. Não há lei no Laos que proíba os cristãos de servirem no exército, mas alguns odeiam muito o cristianismo, porque acreditam ser uma religião estrangeira e uma traição para o país. Por isso, quando alguém se torna cristão é considerado traidor e não deve ter permissão para ingressar nas forças militares. Na época, chorei muito, mas não estava com medo de ser morto. Eu tinha fé em Deus. Eu não estava com medo de morrer porque, mesmo se morresse, estaria com Deus no céu”, explica.
Quando os superiores dele souberam disso, ficou nove meses sem receber salário, que era a renda de sua família e ministério. Peto também foi castigado e pediram que assinasse um papel renunciando à fé. “Eles me disseram: ‘Você escolhe continuar sendo um soldado ou cristão?’. Me pediram para assinar um documento dizendo que eu abandonaria minha fé cristã, caso contrário, não estaria qualificado como militar. Eu decidi servir ao Senhor e recusei assinar o papel. Então, fui dispensado do meu posto. Mas acredito que Deus é real e me conduzirá para fora dessa situação dolorosa. A perseguição me ensinou uma boa lição. Deus me ensinou que aqueles que creem e seguem a Jesus serão perseguidos. Esse é o preço de segui-lo.”
Como você ajudou Peto
Removido de sua principal fonte de renda, Peto pensou que a vida seria mais difícil. Mas o Senhor proveu fielmente para ele e sua família. De fato, isso abriu mais portas para ele servir ao Senhor. “Após servir no exército por quase uma década, me tornei agricultor em tempo integral – plantando vegetais, fazendo carvão, criando galinhas e porcos e limpando a terra de outras pessoas. Mas ao deixar o exército, pude servir a Deus sem muitos obstáculos. Em meu coração, não queria parar de compartilhar o evangelho, queria compartilhar mais mesmo se isso me colocasse em problemas. Eu continuarei compartilhando as boas-novas mesmo nas estradas mais difíceis e perigosas com minha moto velha”, afirma.
Por meio do seu apoio, parceiros da Portas Abertas no Laos ajudaram Peto em seu ministério com treinamentos de discipulado e liderança que não apenas fortalecem Peto quando a perseguição vem, mas também o ajudam a capacitar aqueles a quem discipula. Isso provê a ele ferramentas e métodos para pastorear a igreja de forma efetiva e eficiente.
“Eu participei de seis treinamentos diferentes. Isso teve muito impacto em mim. Eu conheci mais sobre Deus e aprendi como servir a ele e ao seu povo melhor. Foi uma grande ajuda no meu ministério. É meu desejo oferecer a outros cristãos esses treinamentos para que sejam encorajados e capacitados. Obrigado por me permitir participar desses treinamentos. Obrigado por seu apoio em tudo – comida, transporte, acomodação, materiais e principalmente por aprendermos mais sobre Deus. Obrigado por essa oportunidade de estudarmos. Agora sou um homem normal – sem uma posição de prestígio no exército e sem uma reputação – mas servo do único e verdadeiro Deus”, conclui.
*Nomes alterados por segurança.
fonte https://portasabertas.org.br/noticias/cristaos-perseguidos/uma-visita-perigosa-encontrando-um-ex-soldado-que-agora-e-evangelista